Publicado em 16/02/2021
*Por Bruno Rodrigues
A censura imposta pelo YouTube ao Terça Livre, com a remoção dos dois canais na plataforma, foi derrubada pela Justiça na semana passada. Em liminar concedida na última sexta-feira (12), o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) obriga a Big Tech devolver os dois canais da empresa retirados do ar no último dia 3, sob a justificativa genérica, desproporcional e descabida de “violação dos termos de serviço do YouTube”. A decisão judicial determina multa diária de R$ 5 mil em caso de não cumprimento.
A queda de braço com a canal se intensificou após o Terça Livre transmitir o discurso do então presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que falava aos jornalistas sobre seu banimento do Twitter. Após a transmissão, o canal recebeu a primeira advertência do YouTube no dia 25. Segundo a plataforma, o conteúdo do vídeo de Trump “promoveria organizações criminosas violentas”.
Dias depois, a plataforma derrubou os dois canais sob a justificativa de que as políticas tinham sido violadas sem, contudo, especificar quais regras o Terça Livre teria infringido, e impossibilitando o canal de se defender das acusações.
Após a derrubada dos canais, o Terça Livre ingressou com ação na Justiça solicitando o restabelecimento dos canais. Todavia, o juiz Henrique Paiva entendeu ser necessário ouvir a Google antes de decidir sobre a censura praticada contra o Terça Livre.
Apesar da primeira instância ter indeferido o pedido de restabelecimento dos canais, o Terça Livre entendeu que o restabelecimento teria que ser imediato. Por isso interpôs o recurso. No agravo de instrumento impetrado contra a decisão de primeira instância, a defesa do Terça Livre alega que a remoção dos canais é uma “medida desproporcional”, que pode ser caracterizada por uma censura prévia a um canal que está há seis anos no ar, com mais de um milhão de inscritos e oito mil assinantes.
“Decisão de exclusão das contas unilateral e autocrática, com critérios subjetivos e desconhecidos. Exclusão de contas que traduz medida desproporcional, pois a plataforma não se limita a remover o conteúdo tido por problemático, mas as contas e todos os vídeos. Afronta à liberdade de expressão do Agravante. Censura praticada por empresa privada estrangeira”, alegou a defesa do Terça Livre.
Na decisão, o TJ-SP concorda com as alegações da defesa do Terça Livre sobre a desproporcionalidade do banimentos dos canais do YouTube, e cita a necessidade de o canal seguir no ar para conseguir arcar com seus custos e honrar os compromissos com seus colaboradores. A Justiça também ressalta que a remoção viola a liberdade de expressão e ordena devolver os dois canais.
“A remoção das contas da agravante na plataforma YouTube se mostra desproporcional, violando a garantia constitucional da liberdade de expressão e de informação. ressaltar, também, que segundo o afirmado pela autora, trata-se de canal estabelecido, na dita plataforma digital, há 6 anos, com mais de 1 milhão de inscritos e 8 mil membros assinantes, além de contar com uma equipe de 50 funcionários e ter inúmeras despesas para sua manutenção, de forma que a simples exclusão das contas se revela medida por demais drástica”.
O desembargador citou ainda a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) de 2018, que julgou inconstitucional dispositivo da lei federal que regula as rádios comunitárias no Brasil.
À época, o plenário do STF decidiu ser inconstitucional a proibição a “proselitismo” de qualquer natureza na programação das emissoras de radiodifusão comunitária. Segundo os ministros, a norma constitui censura prévia e ofende ao princípio constitucional da liberdade de expressão.
CDC e Marco Civil da Internet são utilizados pela defesa
No agravo de instrumento no qual pleiteou a devolução dos dois canais, a defesa do Terça Livre baseou-se no Código de Defesa do Consumidor (CDC) e no Marco Civil da Internet. De acordo com os advogados do Terça Livre, o contrato com o YouTube é um contrato de consumidor. Segundo o CDC “consumidor é todo aquele que adquire ou utiliza um produto como destinatário final”.
O serviço da Google é que viabiliza o trabalho do Terça Livre de informar. Isto é, o canal não é um intermediário, e sim o destinatário final do serviço da Google. Portanto, o Terça Livre contratou o YouTube para poder transmitir o seu jornal e a Google lucra com a publicidade veiculada no canal. Logo, fica caracterizada a relação que deve seguir o Código do Consumidor.
Outro princípio determinado por lei é que, quando houver dúvidas, as cláusulas de um contrato de adesão devem sempre ser interpretadas em favor do consumidor. Uma das obrigações que o CDC estabelece é o dever de informação, ou seja, o consumidor precisa ser informado em detalhes das cláusulas. Isso também está no Marco Civil da Internet (MCI).
Além disso, as Big Techs devem fazer seus contratos respeitando as determinações do Marco Civil da Internet, cujo um dos princípios é a liberdade de expressão. Nesse contexto, qualquer diretriz que limita uma opinião vai contra o princípio de liberdade de expressão do Marco Civil.
O artigo 19 do MCI trata da possibilidade de excluir um conteúdo considerado inapropriado. No entanto, é necessário ser identificado o ilícito e dar oportunidade de defesa ao proprietário do conteúdo. O Marco Civil coloca limites claros para os termos de serviço, como a liberdade de expressão.
Desta forma, as leis brasileiras tentam restabelecer o equilíbrio entre as Big Techs e os indivíduos e as pequenas empresas. No mais, vale ressaltar que ser excluído da plataforma representa verdadeira exclusão desse mercado, uma vez que o YouTube no Brasil representa 90% do segmento de transmissão de vídeos na internet.
Por fim, o artigo 222 da Constituição Federal tem o objetivo de limitar o controle de estrangeiros em empresas de mídia no Brasil. A intenção do artigo é evitar que os órgãos de imprensa fiquem nas mãos de estrangeiros, a fim de proteger a soberania nacional.
Entretanto, quando o YouTube edita aquilo que pode ou não pode ser noticiado na internet, está de fato burlando Carta Magna e violando a liberdade de expressão.
A vitória na Justiça é apenas o primeiro round de uma batalha que está apenas no início. O Terça Livre vai lutar até o fim para ter o direito sagrado de pela liberdade de expressão, divergências ideológicas e confronto de ideias.
“A mente humana é discursiva, ou seja, dialética. Trabalha com as opiniões discutidas e busca a verdade por meio do raciocínio, confrontando as opiniões vigentes umas às outras até que sejam levadas à prova analítica, aonde apenas aquela que for fiel à razão é chamada de racional. O ‘cancelamento’ passa a ser um silêncio imposto a um ou mais discursos, impedindo a dialética e tolhendo as pessoas de terem acesso à opinião divergente. É um tipo de totalitarismo que impede o amplo debate e impõe um discurso único. Não por meio do debate amplo e aberto, mas por meio da força”, afirmou o jornalista Allan dos Santos, fundador do Terça Livre.
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